O episódio 8 do podcast Sem Dependência promove um debate aprofundado sobre dois temas que ganharam destaque na mídia nas últimas semanas. O primeiro é o modelo implantado em Frankfurt, na Alemanha, que disponibiliza locais específicos para que pessoas façam uso assistido de drogas. O segundo é um alerta sobre o aumento expressivo do consumo de álcool e tabaco entre estudantes no Brasil.
Durante o programa, os participantes analisam os possíveis impactos da adoção de modelos semelhantes ao de Frankfurt em solo brasileiro. Segundo eles, comparar a realidade da Alemanha com a do Brasil pode ser inadequado, já que o país europeu tem uma estrutura social, econômica e institucional bastante diferente, sobretudo no que diz respeito ao crime organizado, que no Brasil opera de maneira muito mais agressiva. Os debatedores reforçam que a solução para a dependência química é muito mais complexa do que aparenta.
“Você querer tratar uma pessoa que tem dependência é muito mais difícil e demorado do que propor uma solução como essa. Nesse tipo de proposta, o dependente continuará consumindo para sempre. Agora, convencer alguém que está doente a fazer o tratamento completo e, de fato, se reabilitar, é algo que pode levar anos”, afirma Fábio Piperno.
“Essa proposta, para mim, é como colocar as pessoas enfileiradas para uma câmara de gás. Não é isso que a gente quer. Nós não queremos organizar as pessoas para que elas morram em condições sanitárias adequadas. Isso não é nem sanitarismo. É uma distorção absurda”, critica Paulo Leme.
O episódio também traz informação sobre a situação das escolas frente ao avanço do uso de substâncias entre adolescentes. Para os participantes, muitas instituições de ensino, especialmente em áreas vulneráveis, se tornaram espaços onde o tráfico age com facilidade. Enquanto isso, os mecanismos de prevenção e as políticas públicas permanecem frágeis ou inexistentes, e a responsabilidade acaba recaindo, mais uma vez, sobre os professores.
“Tudo cai nas costas do professor. Ele recebe um salário péssimo, enfrenta condições de trabalho cada vez piores. Não é incomum que esses profissionais sofram agressões físicas. Chegamos ao ponto em que as escolas se transformaram em ambientes extremamente tóxicos, porque a sociedade, principalmente no âmbito das políticas públicas, sempre focou apenas no problema imediato. Quem não depende da escola pública sequer olha para essa questão. Como política pública, isso foi completamente abandonado”, afirma Paulo Leme.
Os debatedores também criticam o tratamento superficial dado ao tema das drogas tanto nas políticas públicas quanto nos meios de comunicação. Para eles, é fundamental romper com discursos simplistas e investir em campanhas educativas, formação docente e informação de qualidade.
“A evasão escolar tem começado cada vez mais cedo. Muitos adolescentes abandonam os estudos porque começam a usar drogas. Uma das ações que precisamos tomar é levar esse debate para rádios, televisões e redes sociais. Precisamos divulgar informações sobre os efeitos do uso de drogas, estratégias de prevenção. Isso deve chegar aos jovens, porque muitos acreditam que param quando quiserem. Ninguém começa usando qualquer droga achando que vai se viciar. Todos acham que têm o controle”, alerta Miguel Tortorelli.
Outro ponto explorado no episódio é o impacto simbólico das decisões do Estado. De acordo com os convidados, a forma como o poder público lida com a legalização ou a tolerância ao uso de certas substâncias envia mensagens claras à sociedade, o que influencia comportamentos coletivos.
“Isso não tem a ver com ideologia, tem a ver com a maneira como enxergamos o papel do Estado. Ele comunica algo para a população. Conforme o Estado se posiciona e trata determinado tema, ele está mandando um recado, uma orientação para todos nós. Mesmo que você não concorde com essa orientação, você sabe que ela existe”, afirma Paulo Leme.
O episódio conclui que o enfrentamento da dependência química exige a atuação coordenada e comprometida do Estado, com foco em prevenção, investimento em políticas públicas estruturantes e, principalmente, ações consistentes dentro das escolas.
O Sem Dependência é uma iniciativa que busca ampliar o debate sobre a dependência química, um tema que afeta diretamente cerca de 10% da população brasileira, promovendo nos seus episódios quinzenais debates sobre temas atuais. Segundo dados da OMS, quase 30 milhões de brasileiros têm algum familiar dependente químico.
Mediado pelo jornalista Hugo Pereira, o podcast conta com a participação do advogado e escritor Paulo Leme Filho, do ex-coordenador Geral da ONG Amor-Exigente, Miguel Tortorelli e do jornalista Fábio Piperno.